Yoon Suk-yeol, futuro presidente sul-coreano, defende maior aproximação aos EUA e reforço da capacidade de dissuasão militar do seu país. Candidato derrotado tinha culpado Zelensky pela invasão russa da Ucrânia
Yoon Suk-yeol, eleito nesta quarta-feira como novo presidente da Coreia do Sul, defende um reforço da capacidade militar do país, para precaver as ameaças colocadas pela Coreia do Norte, mas também pela China. O candidato do Partido do Poder Popular, o principal partido conservador sul-coreano e maior força política da oposição, derrotou por uma estreita margem o candidato do Partido Democrático, que está no poder. Esta foi uma das eleições mais disputadas na Coreia do Sul em muitos anos.
A invasão russa da Ucrânia e as suas consequências na Ásia, do ponto de vista militar, diplomático e económico, foi um dos grandes temas da campanha eleitoral, com Yoon a posicionar-se de forma bastante afirmativa a favor de um reforço da capacidade de defesa do país e de uma relação mais estreia com os EUA. Pelo contrário, o candidato derrotado, Lee Jae-myung, do Partido Democrático, que está no poder, viu no conflito europeu uma prova de que a Coreia do Sul deve prosseguir uma linha de desarmamento e aposta em conversações de paz com o vizinho do norte.
Uma campanha sobre a Ucrânia
Para além desta divergência de fundo, que deverá ditar uma alteração da política externa e de segurança da Coreia do Sul sob a presidência de Yoon, a Ucrânia esteve no centro da campanha eleitoral por outras razões.
Um dia depois da invasão russa, houve um debate televisivo entre os candidatos. Foi nesse debate que Lee Jae-myung fez uma declaração que se tornou um dos casos da campanha: afirmou que Volodymyr Zelensky não tem qualquer conhecimento de política e diplomacia e “provocou a Rússia”. O presidente da Ucrânia é responsável pela eclosão da guerra”, declarou o candidato do partido do poder. Uma afirmação que se tornou viral nas redes sociais e deixou Lee debaixo de fogo. Yoon zurziu o seu adversário pelos comentários feitos contra Zelensky, e pediu desculpas em nome do povo sul-coreano. Por fim, Lee teve de vir depois a público pedir desculpa pelas acusações lançadas contra o presidente da Ucrânia.
Mas também Yoon borrou a pintura a propósito da questão ucraniana. A 24 de fevereiro, dia da invasão, Yoon usou o caso da Ucrânia como demonstração de que só a capacidade de dissuasão militar pode impedir os países de serem atacados. A aliança da Coreia do Sul com os Estados Unidos, considerou, é a única resposta para a segurança da Península Coreana e para evitar outra guerra entre duas Coreias.
Mas Yoon foi mais longe e considerou que a invasão russa só estava a acontecer porque a Ucrânia tinha falhado a sua adesão à NATO. Cada um à sua maneira, ambos os candidatos culparam a vítima.
Acabar com a “ambiguidade estratégica”
O ainda presidente da Coreia do Sul, Moon Jae-in, eleito em 2017 pelo Partido Democrático, optou pela chamada “ambiguidade estratégica” no relacionamento entre Pequim e Washington, os dois países estrangeiros com maior peso na política externa sul-coreana. Os Estados Unidos são um aliado económico e militar de Seul há décadas, mas as relações com a China têm-se intensificado, à medida que o país reforçou a sua posição como segunda maior economia do mundo, e maior da Ásia, mas também pelo peso geopolítico de Pequim na região. O ascendente da China sobre a Coreia do Norte, a maior ameaça à segurança do vizinho do sul, levou Moon a estreitar relações com o regime de Xi Jinping, na expetativa de fazer avançar as conversações na Península Coreana.
Radares preocupam a China
No que poderá ser uma inversão nessa estratégia, o futuro presidente prometeu intensificar a cooperação com os EUA em todos os níveis, nomeadamente na vertente militar. Yoon afirmou que gostaria de expandir as consultas da aliança sobre dissuasão nuclear alargada com os Estados Unidos, reforçar uma parceria trilateral que Seul tem com Washington e Tóquio, e também juntar-se ao Quad, a plataforma quadrilateral de segurança que junta Estados Unidos, Austrália, Japão e Índia, ou seja, as quatro grandes democracias do Indo-Pacífico. A Coreia do Sul, a outra grande democracia da região, e quarta maior economia asiática, seria um reforço de peso para o Quad.
Para além destes realinhamentos diplomáticos, Yoon manifestou vontade de comprar aos EUA um sistema de mísseis THAAD, para fazer frente à ameaça militar da Coreia do Norte, que tem intensificado os testes de mísseis hipersónicos.
A concretizar-se, esta compra pode deteriorar as relações da Coreia do Sul com a China, que alega que o poderoso radar deste sistema de mísseis pode penetrar no seu território. O negócio pode trazer novas retaliações económicas de Pequim.
Ao invés, a equipa de política externa de Yoon acredita que a compra dos mísseis americanos poderia proporcionar uma oportunidade de “reatar” os laços diplomáticos com a China, pois permitiria um diálogo mais regular sobre segurança, de forma a assegurar que o radar THAAD não é dirigido à China.
Mais armas contra a Coreia do Norte
Sobre o diálogo com a Coreia do Norte, Yoon quererá retomar as conversações e promete apresentar um roteiro com benefícios económicos significativos e rápidos caso Pyongyang tome medidas concretas para desnuclearizar.
Em simultâneo, o futuro chefe do Estado sul-coreano aposta na vertente da dissuasão militar, quer com os pretendidos mísseis americanos, quer com uma ligação mais próxima com os EUA. A ideia apresentada por Yoon é estabelecer um canal de diálogo permanente de três vias, entre a Coreia do Sul, a Coreia do Norte e os Estados Unidos.
Recorde-se que só neste ano a Coreia do Norte já fez nove lançamentos de mísseis, num ritmo sem precedentes. Pyongyang está a testar mísseis hipersónicos, que têm a possibilidade de mudar de rota durante o voo, uma tecnologia que não se sabia estar ao dispor da Coreia do Norte. O país está também a fazer ensaios para colocar em órbita um satélite militar.